Lima
Sou Stefany Lima. Fany no graffiti. Nasci em São Paulo, cresci na periferia de Embu das Artes e vivo em Recife há dois anos. Filha de mãe e pai nordestinos. Me apresento a partir dessas origens, pois acredito que contam muito sobre minha formação, na construção das primeiras memórias, afetos, repertórios, imagens e linguagens. São referências muito vivas.
Olhar para minhas histórias e experiências, reconhecendo sua importância, me faz pensar que não gostaria de ser alguém que não eu mesma, inclusive em minhas criações. Tenho urgências, mas procuro não ter pressa. Sou bastante introspectiva. Vivo me equilibrando.

Não sou fotógrafa, mas desde cedo a fotografia é meu maior exercício de observação, através de experimentos consigo transcrever em imagem aquilo que me chama a atenção e depois filtrar o que é constante e potente. Através dela também pude olhar para o graffiti, a possibilidade de intervir e dialogar na rua. Ultimamente venho me concentrando em produções mais particulares com a pintura e descobrindo a gravura. Tenho meu corpo como principal ferramenta de percepção e expressão, até como representação bastante presente no meu trabalho.

Me (re)conhecer naquilo que faço é o que me move, independente da linguagem que esteja utilizando. A liberdade de não ser ou fazer sempre as mesmas coisas e a possibilidade da repetição quando necessária para compreender meus processos. Me inspira essa dinâmica de estar sempre em movimento, de ter muitos (re)começos e finalidades, mas nunca um fim. Tudo é caminho.


Costumo ter conversas muito abertas comigo mesma, sobre tudo que me toca, quase sempre acompanhada por música. Assim, me vem coisas que até então não percebia, que fazem sentido. Quando consigo digerir essas informações, procuro referências, aplico nas técnicas e linguagens com as quais me identifico, às vezes em rascunhos que estão em andamento. É um caos meio organizado. Sou detalhista. Acho que preciso me arriscar ainda mais. Tô aprendendo!
Procuro me cuidar, me permitir, respeitar meu tempo e meu corpo. Observo, questiono, leio, fotografo, escrevo, ouço música, vejo filmes, desenho, anoto as ideias. Descanso, me faço companhia, dou uma volta pela cidade sozinha. Ouço bastante, às vezes falo pouco, admiro meu silêncio.


Ser arte-educadora. É algo que me tira das zonas de conforto e distancia qualquer “pedestal” que queiram criar para um artista. De onde eu venho isso não pertence, a arte e a subjetividade estão muito próximas da vivência. Normalmente atuo em espaços não-formais com a linguagem do graffiti, como elemento visual para tecer as próprias narrativas nas ruas, geralmente com a juventude de periferia que vem com muitas inquietações e vontade de produzir. Ao mesmo tempo que ficam nítidas as insatisfações, as lacunas deixadas pelo sistema escolar, os abismos que separam.
Então, ser educadora é um exercício constante e sutil de perceber meu fazer. É proporcionar outras leituras sobre a imagem que criaram de/para nós. É responsabilidade de ser mediadora, de me questionar o tempo todo, reconhecer o valor do meu saber e que também desconheço muita coisa. É reverenciar essa possibilidade do desconhecido, mas aprender a buscar na prática a coerência necessária diante de tantas adversidades.
Às vezes me pergunto se vou dar conta. É algo que me deixa na contenção e, ao mesmo tempo, na disposição de compartilhar e somar com tantas potências.

Quando tomei a decisão de mudar sozinha para Recife, entrar para a universidade e cursar Artes Visuais aos 19 anos. Aconteceu muito rápido e tão cedo que ainda estou absorvendo e amadurecendo nesse processo. Diferente da ideia de “largar tudo para fazer o que gosta”, me entender em outro lugar não é tão simples e nem sempre foi uma opção confortável. Isso inclui a academia, onde vejo concepções de arte que contribuem muito em meus processos, mas que também são contraditórias e limitadoras. Ainda estão relacionadas com uma arte produzida para estar em um cubo literalmente branco, com discursos e referências distantes das nossas realidades, que mantém um mecanismo de apagamento histórico, subestimam nossos conhecimentos, mas se apropriam quando convém.
Pensar minha identidade, minhas vivências, meu modo de produzir arte, me colocou em conflitos internos e externos, mas manteve meus pés no chão, procurando me entender nessas complexidades, nessas entranhas. Entendo pelo fato de me sentir continuidade entre as histórias que vieram antes e que vêm depois. É uma lida diária romper sem enrijecer. Mas o modo de se viver em Recife é algo que me inspira pela liberdade de ser que vejo nas pessoas, a muganga de uma gente que vive de andada. São ligações de vida, de pertencimento, de rua, de ancestralidade, de não estar só. Transito entre uma individualidade e uma comunidade que me fortalece, que me fazem converter as dores em possibilidades e caminhar com mais tranquilidade. Está sendo uma fase muito boa!

São muitas e variam! Mas posso contar que me aprofundar na vida e obra de mulheres como Frida Kahlo, Nina Simone, Beatriz Nascimento, Rosana Paulino, Conceição Evaristo, dentre outras, foi um marco. As canções de Luedji Luna tem me acolhido diariamente. Compreendi que a arte diz muito sobre minha subjetividade, que também pode e deve falar sobre incômodos, que conta sobre o tempo em que vivo, que pode canalizar o que vem me silenciar, que minhas histórias importam e são o que tenho de mais singular, que posso dialogar com a minha realidade e me comunicar com o outro.


Sim. São questões que historicamente delimitam espaços. No Brasil é estrutural e tem recortes bem específicos. Acredito que se reconhecer como artista tem outra dimensão quando se afirma enquanto mulher negra. E, quando você passa a compreender como isso funciona sistematicamente, começa a identificar também ações individuais, fica muito mais atenta a qualquer "verdade" que lhe queiram empurrar. É cansativo dar conta das demandas. Mas somos grandes!


Me expressar, ser presente, estar com os meus. Estar feliz com quem eu sou, com quem venho me tornando, com o que devolvo pro mundo.
Busque o que te faz sentido e cuide bem de você. Se dê a oportunidade de olhar para suas fragilidades e potencialidades, isso também te fortalece. Se permita, não se apegue à um único modo de criar, experimente todas as possibilidades.
O último semestre foi bastante intenso. Estou desacelerando e me organizando para não acumular. Por enquanto venho me debruçando em projetos de pesquisa, produção de algumas séries e experimentações.
