Albuquerque
Meu nome é Marcia Albuquerque, nasci e vivo no Rio de Janeiro, Brasil. Estudei Design Gráfico e me formei pela UniverCidade do Rio de Janeiro.
Antes de me decidir pelo Design, passei pelas faculdades de Educação Física, já que fui bailarina clássica por 18 anos, Belas Artes, pois sou filha de um artesão da fundição em metal, e Direito – já nem sei mais porque. Quando criança ainda quis ser lavadeira, arqueóloga, paisagista e arquiteta. Tudo isso cabia em mim, no meu pensamento. Felizmente me encontrei no Design Gráfico. Me formei e sempre fui feliz nessa área.
Há muitos anos atuo no meu estudo de design – Substância 4 Design Integrado, e mais recentemente, há cerca de 5 anos, venho trabalhando profissionalmente com a collage como linguagem paralela.
As Artes Plásticas sempre estiveram presentes em todo esse percurso. Minha casa, durante a infância e adolescência, sempre foi propícia e aberta a expressão através da arte. Meus pais sempre levavam eu e meus irmãos em museus, galerias, teatro, espetáculos de dança e música. Tudo que fosse cultura era bem vindo. Uma casa cheia de liberdade artística e livros, muitos livros, em todos os cômodos existiam livros. E tudo isso forma uma pessoa.
Cadernos de desenho, cola, papéis e imagens sempre estiveram juntos, com breves pausas, mas sempre voltava à eles.
Quando passei a ganhar "mesada", gastava tudo em revistas que cortava sem parar. Já adulta, em consultórios médicos, canibalizava todas, retirava páginas, pedaços, quando não levava a revista toda pra casa.
Continuo com esse hábito, e adquiri outros, como por exemplo pedir revistas que os amigos não querem mais (sou uma espécie de gari das revistas), trago e recorto tudo. Coloco as imagens em caixas e vou usando ao longo do tempo. Lembro de minha mãe forrando umas latas gigantes de tinta com imagens da National Geographics, transformando-as em mini containers para guardar nossos sapatos de criança. Essa coisa toda deve vir pelo DNA.

A cabeça sempre é a principal ferramenta. Observar, olhar o entorno, ouvir, ler, escrever, colecionar palavras, tudo é insumo para um trabalho. Mas o pensar, o refletir sobre algo que te chama, montar conexões, isso é feito dentro da cabeça, lá, naquele lugar onde você vai juntando coisas, emoções, sustos, surpresas.

A motivação é intrínseca. Ela nasce conosco. Uma pessoa motivada, é motivada e pronto. Ela é assim.
A inspiração vem de muito trabalho. Vem dos experimentos, vem dos erros. Vem do querer. Vem de achar que se pode chegar a um resultado X, Y, Z.

Meus dias são como os dias de qualquer um. Tem chateação, tem alegria, tem depressão, tem sonho, tem loucura, tem vontade de jogar tudo pro alto, tem vida, tem morte, tem amor, tem trabalho.
Meu processo é viver e ao longo disso ir encontrando com coisas/assuntos/imagens que me capturam e me impulsionam a trabalhar em cima dessa “coisa”. O “processo” é o principal trabalho. O que sobra é a peça gráfica mas o que me move não é a peça gráfica, o que me move é o processo.
Tenho um caderninho eterno dentro da bolsa e ando sempre com um livro. Como uso muito transporte público são esses os momentos em que leio, anoto, desenho, escrevo. Faço collage, mas curiosamente meus cadernos são mais de escrita do que de collage. Anoto ideias, frases, palavras soltas... A palavra é também um importante ponto de partida para a maioria dos trabalhos que desenvolvo. Anotar é fundamental para o meu pensar. Se as coisas ficarem na cabeça vão embora, somem num limbo cerebral, um buraco que deve existir na cabeça. Curiosamente também percebi que não há obrigatoriedade em em reler o que escrevo, as anotações podem servir apenas para descartar ideias superficiais ou o que anotei pode ser um inicio de assunto.
Se eu for falar da collage especificamente, posso dizer que ela é a arte do encontro (como lindamente disse o arquiteto e collagista Fernando Fuão, em seu livro "A collage como trajetória amorosa"). A tesoura separa o que a cola vai juntar. Essa ideia do “encontro” me encanta. A ideia de abrir buracos nas revistas, retirar, suprimir, deslocar, remover e depois recolocar, juntar, ligar, associar, colar pedaços, faz muito sentido se percebermos que nos formamos dessa forma. Somos pedaços, partes de diversas gerações.

Tenho feito muitas atividades que me pareciam acertivas para manter meu cérebro funcionando, mas recentemente tenho tido vontade de reduzir esses estímulos a 1/3. Tenho sentido muita falta de estar com a cabeça vazia, sinto falta do silêncio, da quietude. A fase multitarefa não tem funcionado mais para mim. Estou nesse processo de mudança e isso certamente vai refletir no resultado dos trabalhos.

Tenho um trabalho que me marcou muito e que provavelmente ainda desenvolverei por algum tempo. Tratam-se de collages digitais cujo tema foi a MEMÓRIA. Fiz um paralelo entre a perda da memória e as pontes que fazemos para chegar até pequenas e confusas lembranças.
Foram 7 collages chamadas “A FRONTEIRA DA MEMÓRIA E A SUBVERSÃO DA PONTE ”. Fizeram parte de uma expo com o coletivo que participo chamado “Collagistas sin Fronteras” - um grupo com diversos colagistas da América do Sul. Esse foi um projeto que levei 1 ano produzindo.


Sim, nos anos 90 fiz uma viagem para Nova York com o grupo do professor Charles Watson, uma imersão em arte pelo programa Dynamic Encounters. Esse programa mudou minha vida pra sempre no sentido de que a partir dele nunca mais pude observar as coisas da mesma forma. Quem não conhece o trabalho do Watson eu recomendo.
Minhas influências ou inspirações são as coisas que vejo, leio ou vivo no dia a dia. Experiências genuínas são importantíssimas. Claro que dentro disso existem pessoas importantes. Não sei se consigo citar algo específico. Hoje tenho esse assunto da “memória” como trabalho e então a partir dele relaciono às coisas cotidianas, pessoas que passam por mim, conversas que escuto, filmes que assisto, textos que leio espontaneamente ou propositalmente. Não há uma fórmula.


Estamos vivendo uma época bastante conservadora e retrógrada. Um fenômeno mundial. Sem um distanciamento histórico não sabemos onde isso vai chegar, nem por que está se instalando. Todos sofrem com esse conservadorismo, mulheres, pobres, negros... todos que por algum motivo não podem escapar, todos que não tem uma rota de fuga. Se isso continuar a evoluir – como exemplo posso citar a censura que vem acontecendo em recentes exposições no Brasil, a cultura é a primeira a ser desestabilizada, e com ela todos que desejam se expressar livremente.
A mulher historicamente, e por muito tempo, esteve na posição de submissão. Felizmente ela reagiu e isso é um caminho sem volta. Vamos sempre reagir, gritar, falar, nos posicionar, cobrar espaço, avançar, realizar e mostrar para o mundo que ele não evolui sem que existamos, sem que nossa postura seja firme e atuante. Nós todos (seres humanos) vivemos eternamente na afirmação da nossa existência.


Realizar me realiza, mas feliz... não sei o que poderia me fazer feliz. Felicidade é um estado que, se prolongado, te faz estacionar, parar, estagnar. Já dizia Guimarães Rosa “o animal satisfeito dorme”.
Para potencializar suas criações primeiro você precisa criar, fazer, algo tem que existir para ser potencializado. Um trabalho que está na cabeça não existe, não significa nada e não pode ser potencializado.


Estou testando um trabalho sobre a passagem do tempo, sobre o tempo que foi e o que vem. Estou trabalhando em objetos com essa finalidade.